Em "Barking Dogs Never Bite", Bung Jun-ho revelou-se tão interessado na história e nas suas personagens como na linguagem cinematográfica usada para a ilustrar. Tratando-se de uma primeira obra, poder-se-ia esperar alguma insegurança da parte do realizador, reflectida num desequilíbrio entre as vertentes formal e substancial, mas tal não veio a suceder. A direcção é firme e não se perde em devaneios formais ou brincadeiras com o meio que ponham de parte o texto. Numa segunda obra, haverá menos tendência para querer mostrar habilidade ou um estilo próprio. «Memories of Murder» não foge a tal regra, mas a sua maior sobriedade decorre, naturalmente, do material-base. Câmara e montagem são exímias ao serviço das necessidades dramáticas, algo que se pode constatar na utilização dos planos-sequência, sobretudo aquele que introduz a acção e nos coloca no meio do mais puro caos, no local onde se encontrou um corpo, rodeado de mirones e onde nenhum agente de investigação parece capaz de cumprir a sua função com o mínimo de competência, de modo a preservar a integridade da cena do crime.
Memories of Murder não almeja ser um thriller pós-moderno; Bong Jung-ho não se rege pelas estruturas e pela linguagem de género. Não a respeita, nem se preocupa em evitá-la. Parte de uma moldura mais vasta, traçando um retrato da Coreia do Sul rural de meados dos anos 80. As especificidades económicas e sociais da época reflectem-se aqui: a indústria pesada está em força e é o principal motor da economia, fazendo-se notar fortemente mesmo num meio rural onde a agricultura é essencial para o sustento de uma franja da população. É um cenário de gente simples, mas onde se sente algum conforto e bem-estar económico. A nível tecnológico, a Coreia do Sul ainda não estava na posição de destaque a nível internacional que ocupa nos dias de hoje e tal reflecte-se nos meios disponíveis para a polícia, que, a dada altura, necessita de uma análise de DNA que tem de ser requerida aos EUA. Na realidade, foi para o Japão que se remeteram as amostras, mas procura-se assim uma maior coerência com a dramatização e com as constantes referências à América como potência económica e ao FBI como paradigma de polícia de investigação moderna, com todos os meios ao dispor.
1 comentário:
Já vi e é uma ganda malha
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