quinta-feira, julho 31, 2008

Depois de 2046 e My Blueberry Nights

O tempo e a memória, os amores perdidos e a impossibilidade de reencontrá-los são os temas mais recorrentes nos filmes de Wong Kar-wai, cujas obras In The Mood For Love, 2046 e mesmo My Blueberry Nights têm ilustrado brilhantemente.
No entanto havia um filme ambicioso e esquecido de Kar-wai - “Ashes of Time” - de 1995 um título considerado atípico na obra do autor, em particular por ser uma incursão no universo “wuxia”, o filme de artes marciais.
Depois de ser exibido em Cannes, “Ashes of Time” ficou perdido no tempo e tornou-se uma raridade, curiouso se pensarmos no título do filme. Até então só poderia ser visto em dvd, cuja a imagem e o som era uma verdadeira afronta para o formato. Agora em versão “redux”, “Ashes of Time” teve o seu relançamento anunciado com pompa e circunstância, com direito a exibição especial durante o Festival de Cannes. A Sony Picture Classics já fechou contrato com a Fortissimo Filmes para a distribuição no mercado norte-americano.

Para “Ashes of Time Redux” WKW não rodou novo material, mas remasterizou, restaurou e reeditou o original. A intenção do realizador foi reorganizar a estrutura narrativa, impor mais clareza e formatar uma versão definitiva para posterior lançamento em DVD.
Para os fãs de WKW, acostumados ao universo predominantemente urbano, mesmo que por vezes sujeito a nostalgias, pode surgir estranheza esta sua incursão no tempo imemorial de “Ashes of Time”. Aqui o género é o das fitas de artes marciais, “Ashes of Time” faz parte do esforço de WKW em se adaptar ao modelo industrial do cinema de Hong Kong, calcado na produção de géneros. Como o enfase na complexidade visual que exigiu uma pós-produção mais demorada, WKW aproveitou o tempo para rodar, com leveza e agilidade, In The Mood For Love, o filme que o tornou conhecido no ocidente.

De artes marciais, contudo, não há muito em “Ashes of Time”. As lutas estão lá, coreografadas como é hábito no cinema de HK, mas estas passam por um processo de desconstrução da imagem, que se tornaria daí em diante uma das marcas recorrentes dos filmes de WKW. O gesto é decomposto, desacelerado, até mesmo paralisado, e reacelerado, num esforço de tornar visível o tempo por trás da acção. À margem desses momentos, o realizador tece uma complexa trama de nostalgia e evocações, a partir das figuras dos dois heróis centrais e das mitologias que os acompanham. A sobreposição de tempos, a indeterminação do foco da narrativa, a aparição de personagens em memórias desconectadas, tornam a compreensão do filme bastante complicada.

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